Distinguimos três grandes mercados de quadrinho no mundo: no Japão, nos Estados Unidos e na França, cada um deles representando um "gênero" - o "manga", os "comics" e a "BD".
Baseada na origem geográfica e em diversos critérios comerciais, essa categorização se explica em parte por razões históricas (até a metade dos anos 1980, os três mercados evoluíram distintamente, sem quase nunca se encontrar) e, que eu saiba, isso não se aplica a nenhum outro meio de expressão. A pintura, o romance, a arte contemporânea, o cinema são de fato considerados universais. Ainda que muito abrangente, a produção cinematográfica de Hollywood não pode ser confundida com um gênero fixo que seria batizado de "movie" e pretenderia definir de uma vez por todas o "cinema americano" no seu conjunto.
No entanto, no quadrinho, é comparando sua produção mais comercial que se define manga, comics ou BD.
Talvez isso tenha sido facilitado por outros fatores: quando são comerciais, os quadrinhos japoneses, americanos e franceses acumulam, tanto do ponto de vista do cenário quanto do desenho, receitas, estereótipos e referências nostálgicas fáceis de identificar e repertoriar. Nesse isolamento, manga, comics e BD acabaram se opondo a ponto de dividir seus leitores. Na França, fãs de manga e fãs de BD, por incrível que pareça, ainda podem erguer os dois "gêneros" um contra o outro.
Mas, quando nos afastamos da indústria do "entretenimento" e observamos o quadrinho de autor, um quadrinho simplesmente mais adulto e audacioso, as diferenças diminuem bastante. Enquanto várias séries formatadas e específicas só atraem fãs respectivos de manga, comics ou BD, acostumados com um formato e nostálgicos dos códigos e dos tiques do "gênero", os álbuns inovadores e todos cheios de sutileza da japonesa Kiriko Nananan (Blue), do americano Adrian Tomine (Summer Blonde) ou do francês Fabrice Neaud (Journal) parecem poder ser lidos, logo, compreendidos e apreciados, tanto pelos fãs de manga quanto pelos aficionados de comics ou de BD, tanto pelos especialistas quanto pelos neófitos, tanto pelos europeus quanto pelos americanos ou japoneses.
Na realidade, a fronteira que separa o quadrinho comercial e o quadrinho de autor parece mais nítida que a divisão entre manga, comics e BD. É esta consciência da universalidade do quadrinho de autor que a iniciativa Nouvelle Manga procura exprimir.
Imaginada em 1999 por Kiyoshi Kusumi, redator da publicação mensal de arte Bijutsu Techô, a chamada Manga Nouvelle Vague - rapidamente resumida em Nouvelle Manga - designou durante algum tempo meus próprios quadrinhos, percebidos graficamente como próximos da BD, mas, lendo-se como um manga, e lembrando, aos olhos dos japoneses, o tom do cinema Francês.
Lançado oficialmente com o manifesto aparecido no meu site na Internet em agosto de 2001, e depois no evento organizado em Tóquio no outono seguinte, a Nouvelle Manga é hoje em dia mais amplamente uma iniciativa de autores que procuram - criando pontes entre os criadores, os editores e os leitores de todas as origens - promover um quadrinho universal, apresentar o que manga, comics e BD têm de melhor e não somente para vender, mas num tom universal do cotidiano, autobiográfico, documental ou ficcional.
Nouvelle Manga é hoje em dia um selo compartilhado por vários editores no mundo: Casterman, Ego comme X, Les Impressions Nouvelles, na França; Akashi Shoten, Asukashinsha, Ohta Shuppan no Japão; Ponent Mon, na Espanha; Fanfare, na Inglaterra e nos Estados Unidos; Coconino Press, na Itália; Dala Publishing, em Taiwan; Casa 21, Conrad Editora no Brasil, para publicar, independentemente das origens geográficas e das questões de "gênero", as criações ou as traduções do melhor do quadrinho internacional, dos livros de mestres reconhecidos como Emmanuel Guibert e Jirô Taniguchi aos de jovens autores como a francesa Aurélia Aurita ou do japonês Little Fish.
Frédéric Boilet
Tóquio, 9 de março de 2006
Atualizado em 12 de agosto de 2007
para a exposição Nouvelle Manga em Belo Horizonte
Tradução em português de Giovanni Ribeiro
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